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prefácio
autodeclarados pardos não aparecem. Essa
démarche
metodológica
é explicada em pé de página e confunde a maioria das pessoas para
quem “preto” e “negro” eram, até pouco tempo, sinônimos. En-
tre os 56,8 milhões de pobres, as estatísticas divulgadas pelos que
apóiam as cotas raciais falam em 65,8% de negros e não 7,1% de
pretos. Omite-se que os autodeclarados brancos são efetivamente
34,2% entre os pobres, e os autodeclarados pardos, 58,7%. Por-
tanto, diz Ali Kamel, “se a pobreza tem uma cor no Brasil, essa
cor é parda”. Esta “descoberta”, publicada no
Globo
pela primeira
vez em 2003, foi a primeira de uma série que permitiu colocar em
xeque um discurso que tentava se impor como verdade para toda
a sociedade, o discurso que visava a construir a nação dividida em
brancos e negros.
No terceiro e quarto capítulos, chama a atenção para as dificul-
dades de concluir, com os dados apresentados, que é o racismo que
produz as desigualdades entre brancos e negros (pretos e pardos nas
estatísticas oficiais). Outros pesquisadores já haviam apontado essa
inconsistência, mas à boca pequena, intramuros, no ambiente aca-
dêmico. Diz mais: mesmo se descrevermos o país, conceitualmente
dividido entre negros e brancos, esses resultados não nos autorizam
a afirmar que tais desigualdades se devem ao racismo dos brancos,
como afirmam os defensores da política de cotas.
Mas os modelos estatísticos divulgados pela imprensa não são o
único alvo de Ali Kamel que se insurge, no capítulo sete, contra
o Estatuto da Igualdade Racial para mostrar que este documento
é prova irrefutável de que há quem queira ver o país cindido ra-
cialmente. O documento, diz ele, é uma prova de que “querem-
nos uma nação bicolor, apenas negros e brancos, com os brancos
oprimindo os negros”. A solução dada por estes que vêem assim o
nosso país nesse documento é investir
ad nauseam
em cotas raciais
de todos os tipos. Será esse o Brasil que queremos?, pergunta ele.
Ali Kamel formula então uma outra e muito mais ousada hipó-
tese. E se o problema for a pobreza e não o racismo? Os capítulos
1,2,3,4,5,6,7,8 10,11,12,13,14,15,16,17,18,19,...20
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